Nos dois primeiros meses da atual legislatura, os deputados compraram combustível, com dinheiro da Câmara, suficiente para dar 255 voltas ao redor da Terra. Para comprovar, apresentaram notas fiscais – no total de R$ 2,5 milhões, o que daria para comprar 1 milhão de litros de gasolina – e foram ressarcidos pela Casa. Essa é apenas uma fatia dos R$ 11,2 milhões que o Legislativo reembolsou aos deputados entre fevereiro e março a título de verba indenizatória, segundo levantamento feito pelo Estado. As cifras engordam salários, alerta o Tribunal de Contas da União (TCU), sem o desgaste de aparecer no holerite dos parlamentares.
Criada em 2001 pelo então presidente da Câmara e hoje governador Aécio Neves (PSDB-MG), justamente para compensar insatisfações salariais, a verba é até hoje de difícil fiscalização. Os dados são obtidos pelo site Transparência no portal da Câmara, mas não há totalizações oficiais por mês ou ano. Para chegar aos números, o Estado pesquisou informações de cada um dos 512 deputados em exercício e dos 22 licenciados ou que deixaram o mandato.
Na lista assim obtida, o campeão de despesas é o deputado Deley (PSC-RJ), que declarou, mediante apresentação de notas fiscais – obrigatória para ter o reembolso da Câmara -, ter gasto R$ 43.585,41 nos dois primeiros meses de mandato, em usos diversos. Ele alega que errou na prestação de contas.
Na seqüência dos que mais gastaram, aparecem os deputados Miguel Martini (PHS-MG), com R$ 43.535,52, e Fernando de Fabinho (DEM-BA), com 43.040,95. Outros 42 deputados não gastaram nada ou não pediram reembolso.
Pelas regras em vigor, cada parlamentar pode gastar até R$ 180 mil por ano, mas o reembolso máximo é de R$ 15 mil mensais. Quem ultrapassa a cota em um mês recebe o valor excedente no mês seguinte. No período pesquisado, 97 deputados estouraram o teto.
A Casa só limita o gasto com combustíveis – R$ 4,5 mil mensais -, medida tomada após a suspeita de que ocorria uso de notas frias e gastos superfaturados, levantada pelo TCU. A prática, porém, mostra que o teto mensal de gastos virou piso. Muitos parlamentares novos, por exemplo, engordaram os gastos em fevereiro e março para usar a cota de R$ 15 mil de reembolso de janeiro, embora não estivessem ainda na Casa.
Na matemática da prestação de contas, vale tudo para não perder um só centavo do teto reservado à compra de combustíveis. Nas declarações são comuns valores quebrados, como estas contas: 971,41+3.528,59, 130,93+4.369,07 ou ainda 3.069,74+1.430,26. No final, porém, a conta dá o mesmo resultado, R$ 4,5 mil.
Os deputados que declararam ter esgotado toda a cota de combustíveis entre fevereiro e março – R$ 9 mil – precisariam de muito mais tempo para esvaziar o tanque. Se esse valor fosse usado para comprar gasolina, de acordo com o preço médio da Agência Nacional do Petróleo (ANP), seria possível ir do Oiapoque (AP) ao Chuí (RS) e voltar três vezes. Depois de conhecer os extremos do País, ainda sobraria combustível para dirigir, ida e volta, de Brasília a Angra dos Reis (RJ).
Para chegar aos R$ 15 mil mensais, porém, os deputados justificam outros gastos em seus Estados. Segundo o levantamento, do total de notas que os parlamentares apresentaram, R$ 1,5 milhão refere-se a aluguéis ou despesas com imóveis e R$ 3,06 milhões a locomoção, hospedagem e alimentação. Há, também, quem justifique custo de pesquisas, divulgação do mandato, consultorias, assessorias, aquisição de software e TV a cabo. (Informações do Estado de S.Paulo)